quarta-feira, 1 de abril de 2009

Ponto de vista.

Fumou o último cigarro, olhando para fora. Lembrando de quão cansativo foi seu dia. Tragava lentamente, sentindo a nicotina entrar em seus vasos sanguíneos. Durante o dia fumar não é a mesma coisa, é muito rápido. O último é mais saboroso...

Apagou-o em seu cinzeiro improvisado, foi até o banheiro, escovou os dentes e preparou-se para dormir. Já deitada, pensava rapidamente sobre o que teria que ser feito no dia seguinte e tentava esquecer, aos menos que por instantes, o que foi feito no que se passou.

Deitada, sentia as pernas doloridas e um imenso cansaço, não é fácil atender seus pacientes e ainda lecionar no outro período. Rapidamente caiu no sono.

De sono leve, sentiu-se incomodada por barulhos vindos da rua. Gritos. Pensou estar sonhando, mas decidiu levantar-se e saber o que realmente acontecia.

Avistou uma mulher e um homem. Ela gritando, pedindo socorro, tentando levantar a calça e ele ao seu redor, tentando segurá-la. Que filho da puta! Pensou esbravejada.

Levantou-se da cama, foi até a sala e – sempre de olho na janela – ligou para a policia. Informou o que via e pediu uma providência daqueles que dizem fazer a segurança da sociedade. Depois do corpo mole e ironias ao telefone, decidiram mandar uma viatura.

Ela, que já não acredita em promessas, permaneceu acordada com o telefone nas mãos, esperando ver se realmente chegariam antes que o delinqüente conseguisse estrupar a coitada.

Chegaram. Assistiu a modesta abordagem. Achou tudo muito calmo. Afinal, o que esperar deles, não estão nem aí mesmo.

Não ouviu mais os gritos e isso, momentaneamente, a tranqüilizou. Voltou para a cama e após alguns minutos deitada, na escuridão, olhando para frente, como se estivesse fitando o vagabundo, caiu no sono outra vez. O fato já fazia parte dela. Pessoa sensível, sonhou.

A imagem ficou em sua cabeça por dias. Se pudesse, encontraria o pilantra e o espancaria, faria o que o policial não foi capaz de fazer. Delinqüente, maldito!

...

Voltando para casa, depois de mais um dia extremamente longo com Samuel, o garoto lindo, de ar sério, que não se impressionava e se abria, Veridiana encontrou um grande amigo, alguém que admira muito, o senhor João - homem forte, robusto, trabalhador, não dispõe de preguiça – e foi logo perguntando se ele também tinha visto a movimentação ocorrida em noites anteriores. João não dormia. Saia de manhã ganhava um bom dia, chegava de noite, as vezes de madrugada, lá estava ele: “Boa noite, Dona Veridiana, toma cuidado com essas ruas, mulher, já é tarde.” E respondia: “Eu sei seu João, eu sei. Mas não se preocupe comigo não, homem.”

- Se vi! A menina estava completamente maluca, pedindo socorro.

Olhava-o quieta, seus olhos de vida própria falavam algo que João não decodificada, por empolgação – ele gostava de histórias – continuou contando.

- Na hora, eu estava lá perto, mas fiquei com medo de que achassem que tivesse querendo bulir da garota e chamei o Christian para me ajudar. Você o conhece?

- Conheço sim. Logo lembrou daquele bonito rapaz de rosto jovial, hábitos afeminados e de educação fora do comum.

- Então... ela estava louca. Dizia que tinham uns bichos dentro de sua calça. Veja só, minha filha, as drogas dominam esses jovens. Onde já se viu bicho dentro de calça assim sem mais nem menos?! Nem tem mato nessas bandas. Se fosse lá pras minhas terras até que era possível.

- Nossa, seu João, que triste. Mas Christian conseguiu ajudá-la?

- E como? Assim que chegou perto ela começou a gritar pedindo socorro, correndo em direção da Avenida. Com medo de alguma desgraça, tentou segurá-la, mas ela não parava. Provavelmente alguém viu a cena e chamou a polícia.

Novamente seus olhos tentavam falar e João prosseguiu sem dar a vez.

- A sorte, Veridiana, que chamei o Christian, que não é cabra macho igual eu. Se tivesse sozinho com ela, com certeza, teria tomado uma surra para mulher de malandro nenhuma botar defeito. Quando os gambés chegaram, logo perceberam que era impossível que o rapaz tivesse querendo possuir as partes da menina, ele, coitado, estava mais assustado que ela.

Veridiana deu um riso leve, o de sempre, fez algum comentário despretensioso e saiu rapidamente, o velho amigo não levou em consideração, pois sabia que cada minuto de descanso era de um valor inestimável para ela.

Enquanto subia pensava no engano. Chegando a porta abriu um pequeno sorriso de alivio. Hoje, Veridiana, antes de chamar a policia tentar entender melhor o que vê.

Um comentário:

Carlos Assis disse...

Silvinho,
Obrigado pelos comentários lá no Na Asa do Vento. Fiquei feliz ao ver seu blog cheio de posts; achei bom você ter voltado a escrever nele com mais frequência. Parabéns pelos textos. Em breve marcamos mais um chopp, certo? É sempre bom conversar com você. É impressionante como na nossa mesa sempre cabe todos os assuntos. É a amizade, irmãozinho!
Abraços, e se cuida!